AC: Via Verde Shopping impede entrada de deficiente físico
Um deficiente físico foi impedido
por um segurança de entrar no Via Verde Shopping, o único de Rio Branco
(AC), às 14h05 de domingo (5), quando tentou visitar o estabelecimento
pela primeira vez. O caso foi testemunhado por um motorista e uma
cobradora de ônibus, além de uma funcionária da franquia da Subway.
Mário William, 44 anos, é muito conhecido na capital do Acre por
circular em locais públicos, apesar da dificuldade de locomoção
decorrente de uma paralisia cerebral que afeta a coordenação motora
desde o nascimento. É alegre, fala com muita dificuldade, mas
diariamente, por recomendação médica, é liberado pelos pais a sair de
casa sozinho para percorrer o centro comercial da cidade.
Querido por cobradores e motoristas, Mário estava no terminal urbano
de Rio Branco, no começo da tarde de domingo, quando decidiu conhecer o
shopping da cidade, que foi inaugurado há um ano e seis meses.
- O Mário disse que queria visitar o shopping pela primeira vez.
Vamos lá, eu falei. Quando chegamos ao shopping, ele se despediu de mim e
da cobradora e desembarcou. Como é ponto final, ficamos estacionados
esperando o horário de retornar ao centro da cidade. O Mário foi ao
shopping e logo voltou. Estava chorando e contou que foi barrado pelo
segurança. A cobradora e eu achamos aquilo um absurdo e fomos com Mário
até o shopping. Foi quando o segurança disse que tinha ordem para não
permitir a entrada de deficiente físico desacompanhado, para evitar que o
shopping fosse responsabilizado por qualquer problema. Uma mulher que
trabalha numa loja presenciou tudo e ficou revoltada com a atitude do
segurança – relatou o motorista de ônibus Deuzimar Nogueira, 31.
O caso se tornou público na noite de domingo. Diones Gomes,
funcionária da loja Subway, relatou no Facebook o que considerou um
"absurdo". Ela disse que o deficiente teria sido impedido porque era
pobre e "não estava bem vestido".
- Perguntei ao segurança o motivo do impedimento. Ele respondeu que
cumpria ordens. Fiquei muito revoltada. Perguntei ao rapaz deficiente o
que ele queria fazer. Ele disse: "Eu só queria conhecer o shopping."
Estava com os olhos cheios de lágrimas e acrescentou: "Ninguém é melhor
do que ninguém". Aquilo doeu meu coração. Então resolvi contar no
Facebook o que presenciei. Estou disposta a testemunhar contra o
segurança e contra o shopping – disse Dione Gomes.
Mário William é filho do casal Márcio Gley Gomes de Souza, 39, de dona Lenira Souza, 64.
- Nós temos três filhos especiais. O primeiro é o Manoel Otemar
Oliveira de Arruda. Ele tem 32 anos. É filho biológico do primeiro
casamento da Lenira. Os outros dois são Mario William, que tem 44 anos, e
o Gildomar, de 29 anos. Eles foram acolhidos por mim e minha esposa. A
nossa família é unida. O shopping desrespeitou a lei porque ele é pobre e
deficiente. Ele pode ser pobre financeiramente, mas é muito rico na
graça de Deus. Além disso, o Mário é muito inteligente e sua vida serve
de inspiração a muita gente. Quando voltou chorando, contou que queria
conhecer o shopping e comprar um presente para a mãe – disse Márcio
Souza.
Márcio e Lenira com os três filhos especiais |
Cadeira de rodas
Consultada pela reportagem na noite de terça-feira (6), Mirla Miranda, da assessoria de comunicação do Via Verde Shopping, primeiramente disse que o rapaz é um pedinte contumaz, mas que a direção do shopping preferia não se manifestar, apesar da proporção de escândalo que o caso havia tomado na rede social.
- A gente não pode ficar respondendo a tudo que escrevem no Facebook. O rapaz tem problema mental e foi ao shopping sem acompanhante e por isso não entrou. Ele mora perto e sempre aparece para pedir. Pela lógica do shopping não é permitida a presença de pedintes.
Nesta terça, a assessora de comunicação tentou se justificar. Disse que havia se equivocado ao prestar as primeiras informações. Na verdade Mário mora bem distante do shopping e não é pedinte.
O superintendente do Via Verde Shopping, Jean Pierre Hass, confirmou que câmeras registraram quando o deficiente chegou ao shopping sozinho, se ausentou e depois voltou acompanhado do motorista e da cobradora de ônibus.
- O segurança abordou no intuito de oferecer uma cadeira de rodas para conforto e segurança do rapaz. A abordagem foi para oferecer comodidade, pois o segurança imaginava que as duas pessoas fossem familiares.
De acordo com Hass, quando alguém é identificado como pedinte, os seguranças advertem que é proibido.
- Muitas vezes a gente conduz a pessoa até nossa central e faz atendimento. Quando é menor, chamamos o Conselho Tutelar. Quando é adulto, o que é raro, a gente aborda e diz que não pode pedir dentro do shopping e nem no estacionamento. Temos muita cautela porque sabemos que um fato dessa natureza é constrangedor para todo mundo. Nosso atendimento não pode desprezar ninguém.
O motorista de ônibus contesta a versão do superintendente do shopping.
- Ele não está falando a verdade. Mário primeiramente tentou entrar sozinho no shopping. Depois, quando eu a cobradora o acompanhamos, o segurança foi muito claro. Disse que cumpria ordens e que deficiente desacompanhado não podia entrar. Ele não ofereceu cadeira de rodas a ninguém. Eu preferi me ausentar para evitar confusão e tratei de avisar à mãe do rapaz – acrescentou Deuzimar Nogueira.
A reportagem voltou ao shopping nesta manhã, quando ainda estava fechado, na companhia de Mário e seus pais. Ele se emocionou várias vezes ao contar o que viveu no domingo naquele local.
- Deus sabe o que faz. Se eu não fosse assim, eu ia fazer alguma besteira com aquele segurança. Sou assim, mas a minha cabeça funciona bem. Eu queria conhecer o shopping. Todo mundo fala do shopping. Eu queria conhecer e comprar um presente pra minha mãe – disse Mário.
Mário com os pais em frente ao shopping |